16.01.23
Um pedaço de azul roubou-me a noite
Dentro daquele cubo de vidro
Uma chuva de estrelas
Uma mãe que dá à luz uma estrela
Uma estrela que é filha do porteiro do cubo de vidro,
Os cortinados do pequeno cubo de vidro
Cortinados que apenas o sono sabe onde habitam
Uma miúda gira mostra a perna ao magala
Magala que às vezes se esconde no cubo de vidro
Quando a espingarda que transporta começa a disparar lágrimas de sangue,
O magala fuma os últimos cigarros da noite
Noite que vivia dentro do pequeno cubo de vidro
Tocavam os sinos
Erguiam-se os mortos das campas ensonadas onde aprendi a gatinhar
E trazia às vezes o mar junto ao peito,
Um pedaço de azul
Azul nuvem
Dentro do cubo de vidro
O vidro opaco da miséria
Que o magala trouxera do ultramar,
O magala escrevia versos
Versos que morriam à nascença
Poemas que se masturbavam na alvorada
Na primeira luz da manhã
Da manhã de uma espingarda.
Alijó, 16/01/2023
Francisco Luís Fontinha