Todas as paredes
As paredes de uma sala
São tristes
São feias
São sós,
Juntamente com as paredes de uma sala
Habitam outras paredes
Com cor
Sem cor
Mas todas elas
Tal como as paredes de uma sala
São tristes
São feias
E são sós,
Depois suspendem na parede de uma sala
Que é triste
Parede de uma sala que está só
E é extremamente feia
Um quadro
Um quadro sem nome
Um pedaço de tela
Aprisionado entre quatro ripas em madeira
Um caixão?
Não
Um caixilho
O caixão serve para transportar corpos
Ossos
Chagas invisíveis
O caixilho aprisiona um pedaço de tela
Um pedaço de tela sem nome
Feio
Muito feio
E triste
Muito triste,
E de que serve dar um nome a um pedaço de tela
Aprisionado dentro de quatro ripas?
Caixilho?
Sim
O caixilho
E qualquer que seja o nome do quadro
Que está suspenso na parede da sala
Parede da sala que é feia
Que é fria
E triste
Será sempre um pedaço de tela
Dentro de quatro ripas
Também tristes
Também sós,
A casa que tem paredes frias
E tristes
E sós
Que nas paredes da sala
Frias
E tristes
E sós
Têm no peito um pedaço de tela
Também ela triste
Também ela só
Também ela fria
E uma janela
Só
E triste
E fria,
Em frente à janela
Uma árvore
Triste
Uma árvore fria
Só
Durante o dia
Poisam sobre a árvore
Pássaros tristes
Frios
E sós
Durante a noite
Sem que ninguém consiga ver
Poisa a lua
E as estrelas,
A casa triste
Feia
E só
Tem lágrimas
Tristes
Feias
E sós
E tal como o pedaço de tela
Aprisionado dentro de quatro ripas
Não tem nome
Nem fome
Mas tem lágrimas
Tem um pedaço de tela
Tela muito fria
Muito triste
E só,
E quando a luz se extingue na mão das estrelas
Este pedaço de tela
Aprisionado dentro de quatro ripas
Tristes
E sós
Também se extingue
E este pedaço de tela
Não fala
Não come
Não bebe
Ou fuma
E este pedaço de tela é apenas um pedaço de tela
Sem nome
Triste
Muito triste
E muito só,
E este caixão
(perdão, este caixilho)
É o único abraço que este pedaço de tela
Muito só
Muito fria
E triste
Tem,
Quem mias de que um triste e só caixilho
Para abraçar um pedaço de tela
Tela muito fria
Tela muito feia
Tela muto triste…
E tal como o caixilho que abraça uma tela
Uma tela fria
E triste
Uma tela só
Apenas uma mãe
Abraça o seu filho
Seu filho muito triste
Seu filho só
Muito só
E às vezes
Uma mãe
Pega em todos os pedacinhos do seu filho
Aqueles pedacinhos que jazem no pavimento da loucura
Coloca-os sobre a mesinha-de-cabeceira
E aos poucos
Aos poucos devolve-o à vida,
Não sou um pedacinho de tela
Deram-me um nome
Não tenho um caixilho que me abrace
Mas tive uma mãe
Mãe que pegou em todos os meus pedacinhos
Os colocou sobre a mesinha-de-cabeceira
E devolveu-me à vida
Tal como o fez pela primeira vez.
Alijó, 02/01/2023
Francisco Luís Fontinha