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Cachimbo de Água

Blog de Francisco Luís Fontinha; poeta, escritor, pintor...

Blog de Francisco Luís Fontinha; poeta, escritor, pintor...


22.03.23

No esplendor da noite

Um fio de sémen

Poisa na sombra adormecida do meu esqueleto,

E da paixão dos pássaros,

Oiço os gritos de um Deus arrogante…

Distante dos rostos envenenados da solidão,

 

O rio,

Morre na minha mão…

Como morreram todos os rios,

Como se suicidaram todos os rios que conheci…

Todos,

Todos na minha mão,

 

Desenho no teu pincelado olhar

A tristeza que os dias transportam desde a montanha,

O sol, o sol esconde-se numa pequena caixa de sapatos,

E do corpo,

As pequenas lâminas da alegria…

Fogem em direcção ao mar,

 

Cai a máscara sobre o chão lamacento do silêncio,

Ouvem-se os gritos e gemidos da morte…

E da minha mão,

O enforcado rio em pedacinhos de sorriso…

Feliz;

Feliz porque deixou de sofrer…

E agora…

Brinca dentro de um cubo de vidro

Com janelas adormecidas

E olhos adormecidos…

 

 

 

Alijó, 22/03/2023

Francisco Luís Fontinha


16.03.23

Às vezes

Era a chuva que nos abraçava,

Outras vezes,

Muitas vezes,

Era o desejo que nos silenciava.

 

Às vezes

Tínhamos o perfume de amêndoa

Que a manhã nos dava,

E tantas vezes,

Muitas vezes,

Não tínhamos nada.

 

Às vezes,

Poucas vezes,

Rezávamos,

Outras vezes,

Muitas vezes,

Embriagávamo-nos com o silêncio dos peixes…

Mas nunca nos disseram,

Que das outras vezes,

Umas poucas,

Outras tantas…

Havia uma estrela que nos olhava.

 

Às vezes,

Eu escondia-me na tua mão,

Outras vezes,

Tantas vezes,

Eu tombava no chão…

 

E de todas as vezes

Que me perdi nas outras vezes,

Guardo dentro de mim…

As vezes que sofri.

 

 

 

Alijó, 16/03/2023

Francisco Luís Fontinha


27.12.22

Caíam sobre nós as navalhas de vidro

Que da noite traziam todos os silêncios visíveis e invisíveis,

 

Naquele tempo

Acreditava ser um pequeno espantalho

Algures esquecido num qualquer campo de milho

À espera de que regressassem as amuradas da insónia,

 

Nunca regressaram e nunca me importei por tal:

Às vezes a noite escondia-se dentro de um pequeno cubo de vidro

Como sempre se esconderam as nuvens

E a chuva e a geada,

 

As abelhas picavam os braços emagrecidos dos espantalhos

(que só a mãe consegue perceber)

E mesmo assim

Habitava numa redoma de vícios

E muitas vezes empenhei o meu esqueleto…

Que ainda hoje

São duzentos e seis ossos de dor.

 

E erguiam-se sobre nós

As tempestades cinzentas das marés

Quando descia sobre o corpo a ressaca

E voávamos sobre uma planície pincelada de negro horror.

 

Hoje não me escondo

E tão pouco sou um espantalho…

 

 

 

 

Alijó, 27/12/2022

Francisco Luís Fontinha


16.11.22

Morreste-me sem que eu tenha escrito no mar

As canções de embalar que deixavas ficar sobre as minhas mãos

E acreditava que os teus papagaios em papel

Eram beijos

Que eu passeava pela rua puxando-os com um cordel de sono

 

Inventava triciclos com rodas de insónia

Enquanto um boneco parvo

Caminhava na minha algibeira

Tenho medo

E não percebo porque este navio sem destino

 

Ainda se passeia pelo corredor

Porque neste corredor

Apenas habitam sombras de ossos

E lábios de dragões envenenados pelo túnel do inferno

E os apitos deste navio

 

Mal respiram devido ao cansaço do fumo

Destes cigarros sem nome

Que transporto no olhar

Morreste-me sem que eu tenha escrito no mar

As tuas súplicas

 

Nas tuas noites de medo

Ouvia-te em sofridos suspiros enquanto desenhava num caderno

As árvores

As minhas árvores que deixei ficar

E apenas os pássaros que dormiam nessas árvores se recordam de ti.

 

 

 

 

Alijó, 16/11/2022

Francisco Luís Fontinha


29.10.22

Morreram-me todas as fotografias

Enquanto a espuma do luar pertence-te

E do húmus silêncio

Regressam ao meu peito as flores da loucura

De um Deus ausente,

 

De uma mão que acusa

Se levanta e ergue sobre a manhã

As cerejas da Primavera

Somos instantes

Fios de sombra

 

Nas asas de um rio,

Somos pertences

Na algibeira dos jardins inconformados

Entretanto

Suportas-me

 

E finges que nas minhas mãos

Não transporto a dor

E o sangue das catacumbas envenenadas

Que sinto correr nas minhas veias…

São como o meu corpo; veneno.

 

E desta manhã embalsamada

Onde guardo as lágrimas do sorriso cio

Invento em ti

As palavras que semeio

Das palavras que lanço ao vento.

 

 

 

Alijó, 29/10/2022

Francisco Luís Fontinha

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