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Cachimbo de Água

Blog de Francisco Luís Fontinha; poeta, escritor, pintor...

Blog de Francisco Luís Fontinha; poeta, escritor, pintor...


13.08.23

20230813_194859.jpg

Esqueço os teus olhos de mar

Em mar teus lábios de mel

Esqueço os teus olhos em luar

Do luar que assombra este papel

 

Esqueço a tua boca e o teu cabelo de vento

Esqueço o domingo inventando

Espadas no meu pensamento

Do lamento esquecer os teus olhos que fui sonhando

 

Esqueço que este poema não te pertence

Que este poema morreu junto ao rio

Esqueço a força que me vence

 

Quando a noite se esconde na madrugada

Esqueço que este navio

É uma lágrima assombrada.

 

 

13/08/2023

Francisco

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


31.05.23

Este velho navio

Transporta-me para os teus braços

Quando a noite sitiada no teu ventre…

Um poema de lágrima

Sorri nos teus lábios.

 

Navega nos teus lábios

Este velho navio de sono

Em pequenos círculos

Navega nos teus lábios

O astrolábio dos teus olhos…

 

Veneno que mata as estrelas

As estrelas que iluminam este velho navio

Que os teus lábios absorvem…

Da noite embrulhada nos teus seios…

A madrugada apenas nos pertence.

 

 

 

Luís

31/05/2023


20.11.22

Sou o comandante deste pobre navio.

Um objecto de sucata,

Toneladas de aço,

Multidões que se escondem em corpos,

Multidões com muitos braços,

Com muitas pernas,

Com pénis e vaginas,

Olhos e lábios e sorrisos e pequenos luares,

Mares,

Canções e canetas,

 

Pedras,

Pedras em silêncio,

E silêncios em pedras,

Que morrem,

Que nascem,

Que fodem,

Que me fodem

Todos os dias,

Entre segundos e minutos,

A todas as horas que o dia esconde,

 

E se me perguntarem o que me esconde o dia,

Diria…

Nada,

 

Como nada são as palavras que escrevo,

Durante o dia,

Da noite e à noite,

Nada,

Como nada me escondo do nada,

Sabendo que entre o nada e o medo,

 

Prefiro o medo.

E este navio é impaciente,

Um pouco louca até,

Sucata,

Com um coração de lata,

Com telhado zincado, minha pobre cubata.

 

E eu o pobre comandante,

O gajo que puxa o cordel onde habitam os meus cacilheiros

Com marinheiros com putas com flores com shots de uísque aldrabado,

Depois sentava-me em Belém,

Escrevendo palavras também elas aldrabadas,

Digamos que sou um charlatão das palavras,

Um vigarista da poesia,

E mesmo assim, não sabendo nada, sei que há mulheres que gostam do que escrevo,

 

Coitadas delas,

Coitado de mim,

Nem elas,

Nem eu,

Somos um jardim,

 

E à frente deste navio,

Eu, o comandante sem diploma de comandante,

Eu, o poeta, sem diploma de poeta,

Eu, o velho cacilheiro sem rio para brincar.

 

E este navio vai andando,

Com a graça de Deus,

Umas vezes afunda,

Outras,

Faz-se passear na lua,

 

E tal como as minhas palavras,

Sem futuro,

Das palavras à morte,

O diabo que o parta e escolha,

Esta sorte,

Ser comandante de um navio sem nome; um navio sem sorte.

 

 

 

 

 

Alijó, 20/11/2022

Francisco Luís Fontinha


02.05.12

E o navio se esconde


e o navio se abraça,


 


e o navio sem nome


procura outro navio ou barcaça,


 


e o navio com fome


na cidade da desgraça


sem nome


sem graça.


07.06.11

S. Tomé e Príncipe a entrar-me pelos olhos, rumo à garganta e quando me apercebo, a paisagem mergulhada nos meus lábios, oiço as gaivotas penduradas no navio, e as canoas aos poucos tomam-nos de assalto, bugigangas ao preço da chuva, búzios em que se podia ouvir o mar e eu sentado numa esplanada junto ao Tejo, nas minhas costas o museu dos Coches de portas fechadas, e de vez em quando o roncar do vinte e oito em linha recta para Moscavide, peças de chita estampadas à volta de um cartão, colares de missangas, e eu no chão a fazer desenhos e a imaginar como seria a ilha, e tive medo de descer do navio e caminhar cento e cinquenta metros sobre o mar, e os camuflados levavam-me para a piscina do navio, e hoje percebo que no olhar dos camuflados existia o sorriso do regresso a casa, e no meu rosto, em mim as lágrimas da partida,


 


- Quinze anos depois ele sentado na esplanada, sobre a mesa um livro que aproveitava a tarde para dormir, e ele em minutos distantes com a chávena na mão a olhar a o padrão dos descobrimentos, fotografava mentalmente as pessoas que corriam na rua, e via nas mulheres a rotação da lua, os comboios a cruzarem-se em Belém, e até ele o cheiro do rio a caminhar lentamente para o mar,


 


Em mim as lágrimas da partida, e na noite o baloiço do navio, um balançar inconstante, e amargo, e depois adormecia e sonhava que corria nas ruas de Luanda pela mão do meu pai, e eu cansado, e nunca mais chegava ao fim, sentia que a viagem não tinha término, e hoje, hoje ainda sou uma criança em viagem que aguarda pelo regresso, o meu corpo cá, mas algo de mim circula pelo oceano, e mergulha, e vai ao fundo, e volta à tona,


 


- E quando o rio abraça o mar nas minhas mãos as algas agarram-se ao meu peito e que me puxam para o infinito, atravesso a linha, vou até à margem e sento-me, cruzo as pernas, entrelaço as mãos e vejo um navio silenciosamente que corre em direcção ao porto de abrigo, junto às grades uma criança a dizer-me adeus, o corpo do miúdo que quinze anos antes suavemente chegava a Lisboa,


 


Em mim as lágrimas da partida, e vai ao fundo, e volta à tona, e o pouco que resta da criança em círculos concêntricos na crista das ondas, uma saudade impressa numa finíssima folha de papel agarrada a sílabas dispersas, e este navio não pára de gemer e balançar na noite, acordado, olho o tecto do camarote, e pergunto-me, e pergunto ao meu pai,


 


- Porquê pai?


 


 


(texto de ficção)


Luís Fontinha


7 de Junho de 2011


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