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Cachimbo de Água

Blog de Francisco Luís Fontinha; poeta, escritor, pintor...

Blog de Francisco Luís Fontinha; poeta, escritor, pintor...


23.02.23

Às vezes, visitavam-me os barcos de brincar,

Depois, pegava num pedacinho de silêncio,

Subia mangueira acima…

E voava em direcção ao mar,

 

Sobre o mar, disfarçava-me de nuvem,

Corria, corria… corria,

E quando regressava a noite,

Ia até ao luar,

Sentava-me na lua,

E desenhava sonhos no teu olhar,

 

Hoje, não tenho mais barcos de brincar,

Nem pedacinhos de silêncio,

Nem noites de luar…

Tão pouco sei voar

Ou sonhar,

Mas tenho o teu olhar.

 

 

 

Alijó, 23/02/2023

Francisco Luís Fontinha


30.03.15

Pareço um sedimento


Quando acordam as abelhas


E as migalhas de gelo


Que não pareço


Sonham nas árvores do teu jardim


Sou o vagabundo transatlântico


Desgovernado


Como sempre fui


Desde que nasci


Quando abriram a janela do perfume


E lá estavam elas


Todas preenchidas


 


Empilhadas


As nuvens de um Domingo


Sem endereço


Ou… ou identidade


Sinto no teu olhar o luar de Janeiro


Porque nasci em Janeiro


Era Verão


O calor entranhava-se na minha mão


Ouvia o sorriso dos parvalhões


À minha volta


Tão pequenino


Tão…


 


(o caralho que vos foda, pensava eu)


Quem são estes gajos


E estas gajas…


Ninguém me respondeu


Ninguém


Hoje são apenas palavras


Mortas


Numa cidade


Morta


Como as ditas migalhas de gelo


Cambaleando num calendário enforcado numa parede


Havia riscos


 


Letras indecifráveis


Papéis velhos


Não amigáveis


A guerra


O silêncio das balas


Cruzando o berçário


Eu era um ranhoso


Rabugento


Sempre aos berros


E mal abri os olhos


Barcos


O meu primeiro sonho


 


Fugi


Mudei de nome


Hoje não sei onde nasci


E se essa terra ainda existe


Ou… ou é apenas uma imagem sem coração


O dia deitava-se sobre a pedra fria da morgue


Eu percebia que lá fora


Alguém


Me esperava


Para quê?


Se eu nunca quis ninguém…


Ao meu lado para me esperar


 


Eu só queria partir


E voar…


Pegar numa faca


E cortar todos os segredos


E todas as sombras


De um quintal


Com mangueiras


E um papagaio em papel


Desenhos


Desenhos no meu peito


Que hoje escorregam quando me levanto


E se transformam em lixo…


 


Francisco Luís Fontinha – Alijó


Segunda-feira, 30 de Março de 2015


23.11.14

Sinto a falta do fumo do teu cigarro,


não percebo a ausência das tuas mãos...


quando poisavam no meu rosto,


e dos teus lábios sobejavam palavras que não me cansava de ouvir...


sinto a falta do teu olhar embrulhado no cacimbo,


e das mangueiras que brincavam no nosso quintal,


desenhando bonecos de sombra no meu peito,


sinto a tua falta...


e imagino-te a galgar o portão de entrada com um brinquedo debaixo do braço,


e eu...


e eu adormecia no teu colo,


sonhando com barcos de papel e triciclos de luz...


 


 


 


Francisco Luís Fontinha


Alijó, 23 de Novembro de 2014


25.07.14

Quando o tambor do desassossego entoa no coração da sanzala,


há uma palavra reescrita na pele húmida do amanhecer...


leio... leio SAUDADE...


 


Sento-me junto ao pequeno charco acabado de nascer,


puxo de um cigarro,


e finjo ver o mar a regressar da sombra das mangueiras,


as pequeníssimas películas de cacimbo alicerçam-se aos meus dedos,


ao longe, mulheres... e fogueiras,


e missangas de medos,


saltitando nos braços cansados de um esqueleto de papel,


oiço o bater fulgurante do zinco conta a solidão de um menino chorando,


 


Um dia a guerra o levará,


sua mãe morta rezará no altar da areia branca do faroleiro de pedra,


os meus dedos minguam quando um cadáver de insónia poisa no meu cigarro...


e espero... e não regressa o mar,


desce um corpo de prata dos coqueiros envelhecidos,


há uma palavra reescrita na pele húmida do amanhecer...


leio... leio SAUDADE...


e adormeço sem me apetecer,


 


Em criança brincava com silêncios e um velho triciclo em madeira,


acreditava nas flores,


acreditava que um dia..., que um dia voava como os pássaros,


envelheci, e o meu cigarro terminou quando um paquete de rebuçados atracou em mim,


transeuntes com pesadíssimos caixotes em madeira,


choravam...


e círculos de espuma saltavam à corda no cais dos caixotes em madeira...


perdi-me, e hoje... e hoje sento-me junto ao pequeno charco acabado de nascer,


 


O mar não regressará nunca,


 


E,


 


Quando o tambor do desassossego entoa no coração da sanzala,


há uma palavra reescrita na pele húmida do amanhecer...


leio... leio SAUDADE...


 


E leio sofrer!


 


 


Francisco Luís Fontinha – Alijó


Sexta-feira, 25 de Julho de 2014


25.04.14

vivo fingindo viver


procurando o que já morreu


inventando palavras que nunca tive a coragem de escrever


vivo esperando o amanhecer


que da madrugada cresçam lábios de cereja


e pedacinhos de papel com barquinhos desenhados


vivo debaixo da sanzala encarnada


olho o Sol e sinto a tua pele misturada com imaginados sorrisos


de prata


cachimbos mergulham e acreditam que


vivendo fingindo viver...


um dia


 


um dia vou regressar ao quintal recheado de mangueiras


com sombras estrelares


fingindo


correndo...


amando os velhos telhados de luz


como amo o fingimento de fingir que vivo


 


vivo fingindo viver


nesta jangada de silêncio


com velas de pano


viver viver viver...


não sabendo o significado do amor


amando fingindo que amo


sou um marinheiro esquecido no Oceano


procurando


inventando...


dormindo nas esplanadas que habitam no Tejo


recordando muros amarelos


porque fingindo viver... não vivo... não vivo esta vida de corpos em mármore.


 


 


Francisco Luís Fontinha – Alijó


Sexta-feira, 25 de Abril de 2014

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