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Cachimbo de Água

Blog de Francisco Luís Fontinha; poeta, escritor, pintor...

Blog de Francisco Luís Fontinha; poeta, escritor, pintor...


25.11.22

Abraço-me a este pobre rio

Onde poisam os barcos sem nome

O comandante

Bebe as lágrimas dos subúrbios da insónia

E sobre os ombros

 

Os dedos imaginários das tuas mãos

A serpente de Deus

Brinca no teu pescoço

E um beijo voa sobre o mar

A casa

 

A casa é indivisível

E um portão de ferro

Apreende as primeiras lágrimas da manhã

Batem à porta

Senta-se sobre a sombra e enforca-se com o poema

 

Em pedacinhos de sono

A mesinha-de-cabeceira geme

Como gemem os gonzos das portas por onde entro

E destes sonhos que me despeço

O mar leva-me

 

E parto em busca dos teus cabelos

Que semearam as planícies do teu diário

E dos dias das minhas mãos de luz

O silêncio

Deste rio onde poisam os barcos sem nome.

 

 

 

 

Alijó, 25/11/2022

(Francisco)


12.11.22

 

Meu amor, hoje pertenço-te como me pertencem as estrelas em papel das tuas lágrimas, quando da noite, sem que ninguém percebesse, trazias a mim as palavras semeadas das primeiras chuvas da manhã, e sabíamos que os pássaros nocturnos do Inverno poisavam nas tristes árvores das tuas mãos,

E sabíamos que um dia vinham a nós os triângulos da madrugada,

Meu amor, hoje pertenço-te como pertencem as espingardas das alegres marés do infinito amanhecer,

Um dia,

Tristes,

As palavras do teu olhar.

Vivíamos nas margens invisíveis do rio sem nome, e entre as pontes do sono, vinham a nós as sombras dos velhos aviões que sobrevoavam as mangueiras entre danças no quintal de Luanda, o triciclo, ensonado, cantava quando o miúdo dos calções lhe pegava na mão

E ele,

Não, mãe, não.

O medo.

A LHÁ lá ao fundo, e suspenso no pescoço da mãe, que ambos não ultrapassavam os quarenta e cinco quilogramas, desenhava pequenos círculos de luz sobre uma LHÁ até perder de vista, depois, vinha novamente o triciclo, e ambos sabíamos que em breve regressaria a noite aos lábios da Princesa lunar, como regressaram muito mais tarde todas as pedras e todas as folhas das árvores em despedida,

O medo.

Da LHÁ, todas as tardes de Domingo, erguiam-se pequeninos corações de prata e percebia-se que dos seus olhos lacrimejantes da maré dos sonhos, um pedaço de paixão poisaria na sua mão, como muitos anos mais tarde, poisaram as nuvens sem nome.

Depois, um dia, esqueceu-se de acordar.

A janela tinha ficado aberta, e a noite quase a terminar, escrevia poemas sobre o lençol desossado do corpo putrefacto na infinita madrugada, e como todas as madrugadas, uma fina lâmina de paixão abraçava-a e beijava-lhe cada pedacinho de milímetro quadrado do corpo, e o caule e as folhas, murchas, deitavam-se sobre a sombra de sémen que um ausentado crucifixo envenenado tinha derramado, enquanto sobre a mesinha-de-cabeceira, um velho relógio engasgava-se entre as dez e as doze horas, e nunca percebemos porque morreu,

Como morrem os relógios, meu amor?

Morrem como a LHÁ,

E brincam como a LHÁ…

Meu amor, hoje pertenço-te como me pertencem as estrelas em papel das tuas lágrimas, quando da noite, sem que ninguém percebesse, trazias a mim as palavras semeadas das primeiras chuvas da manhã, e sabíamos que os pássaros nocturnos do Inverno poisavam nas tristes árvores das tuas mãos,

E sabes, mãe?

Percebi que uma mãe nunca tem nojo do filho,

Até que ele se transforme em poeira,

Acordávamos de mãos entrelaçadas como entrelaçados sonhos acordavam nos nossos lábios, depois, um beijo despedia-se,

Maldita mosca!

Não percebi, meu amor…

Ninguém percebeu,

Do rosto encharcado de sangue, as feridas silenciosas viviam como vivem as flores no meu pobre jardim,

E como viviam as flores do teu pobre jardim, meu amor?

Ensonadas, meu amor, ensonadas como todas as nossas noites.

Ele chorava.

Ela rezava.

Eu…

Pedia a Deus que uma equação qualquer resolvesse o meu problema, mas tal como ela, nenhuma equação veio a mim,

Ele,

Ela,

Lágrimas de sangue, meu querido.

E de sangue,

Eram feitas as palavras dele, quando se escondia debaixo da colcha como se fosse uma criança; uma criança que acabava de fazer uma qualquer asneira, coisas sem interesse, coisas de criança.

E do peito, uma lágrima de sono acordou.

 

(LHÁ=água do mar)

 

 

 

Alijó, 12/11/2022

Francisco Luís Fontinha


10.11.22

Estávamos no Inverno

E das tuas mãos finas longas e frias

Vinham a mim as palavras entre marés adormecidas

Sobre a frágil melancolia dos teus olhos

Um pedacinho de sorriso meu

 

Caía sobre o mar de insónia

Como crianças em brincadeira

À volta de uma fogueira invisível

E percebia-se das nuvens que nos abraçavam

As gloriosas flores em combustão

 

Todas as manhãs

Abro a janela para o mar

Limpo a poeira nocturna que sobre os meus livros dorme

E numa carícia

Invento o sono nos teus olhos de poesia

 

Guardo as tuas lágrimas de luz

Desço as escadas que me levam durante a noite

Às esplanadas dos grandes rochedos

Saltamos o muro da infância

E na tua mão acordam as madrugadas simples sem sótãos

 

O poema que trazes no corpo

Aos poucos

Puxa a minha triste mão

E de um cigarro anónimo

Regressam a mim as lareiras das tardes sem literatura

 

 

 

 

Alijó, 10/11/2022

Francisco Luís Fontinha


09.11.22

Há um pequeno sorriso

Nos teus olhos de amar

Há uma manhã que se despede

Dos eternos jardins em poesia

Há uma lua sem luar

 

Em cada novo dia

Há uma árvore

Que se deita na tua mão

Uma árvore sem pássaros

E um pássaro sem pão

 

Há um pequeno sorriso

Nos teus olhos de amar

Uma casa inabitada

Perto de uma ponte com fome

Há um rio sem nome

 

Que se abraça aos socalcos da madrugada

Um rio que nunca se cansa

Das minhas tristes palavras

Um rio que inventa

As lágrimas dos teus lábios

 

E as lágrimas da tua boca

Há um beijo no teu corpo

Um beijo desenhado por um sem-abrigo

Um beijo desejado

Um beijo em perigo

 

 

 

Alijó, 09/11/2022

Francisco Luís Fontinha


08.11.22

Menina do além-mar

Que habitas no castelo desejo

Transformas as lágrimas de chorar

Em estrelas de papel colorido

E nos lábios lanças um beijo

E nas mãos tens os barcos de brincar

Menina do além-mar

Que semeias no vento

Palavras de encantar

E desenhas no luar

As marés infinitas das noites de insónia

Menina do além-mar

Que transformas as lágrimas de chorar

Em estrelas de papel colorido

E trazes no olhar

Os sonhos de sonhar

Menina do além-mar

Não tenhas vergonha de chorar

Porque as tuas lágrimas

São estelas que sabem voar

 

 

Alijó, 08/11/2022

Francisco Luís Fontinha

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