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Cachimbo de Água

Blog de Francisco Luís Fontinha; poeta, escritor, pintor...

Blog de Francisco Luís Fontinha; poeta, escritor, pintor...


30.08.22

(de todos os meus professores, guardo saudade e amizade; mas o professor Mário Abrantes, conseguia aliar a arte ao cálculo, e as suas aulas eram um poço de cultura geral. Grande abraço, professor)

 

Tínhamos na mão

As sete esferas da saudade,

E sabíamos que dentro do cubo de vidro,

(a prisão das palavras)

Havia uma janela com fotografia para o mar.

Depois, acordávamos abraçados às sete espadas da liberdade

Que guardávamos dentro de um caderno quadriculado.

Víamos a nossa imagem no espelho da madrugada,

Quando nas frestas em gesso, um crucifixo sorria…

E dávamos conta que este sorriso pertencia

À criança mais feliz da aldeia.

As palavras chegavam-nos através da velha alvorada,

 

Enquanto sobre as mangueiras,

No distante quadrado, víamos as gaivotas em cio,

E não percebíamos o que era a paixão.

Escrevíamos.

Dançava-mos sobre os pequenos charcos

Que pela manhã acordavam e ainda transportavam no olhar

O desejo preguiçoso que só o poema consegue descrever.

Tínhamos na mão

As sete esferas da saudade,

E como crianças que éramos, das palavras

Inventávamos asas

Como inventam os pássaros antes de morrer,

 

E não sabíamos que os peixes,

Entre parêntesis sonâmbulos,

Resolviam equações complexas,

Que apenas o professor Mário Abrantes percebe,

E nós, apenas percebemos de desejo.

E nunca sabíamos se as sete esferas da saudade

Sabiam o que é o mar…

O que é o mar?

Perguntava-me um pedacinho de sombra

Quando descia o pôr-do-sol e junto a mim,

Sem o saber… um pedacinho de luz beijava-me,

E eu tinha medo do sono.

 

Acordava a manhã,

No quadro uma mistura e letras e números…

Quando perguntam o que era…

Eu…

Série de Taylor;

Como se isso interessasse para dois cubos apaixonados.

Não sei o que é a chuva!

Apenas recordo os longos lábios de cacimbo

Sobre os meus frágeis ombros,

E mesmo assim,

Um barco deitava-se no meu colo,

E das suas coxas, ouviam-se os apitos da solidão.

 

 

 

Alijó, 30/08/2022

Francisco Luís Fontinha


05.11.21

Milimetricamente falando,

Sou uma simples quadrícula sem memória,

Nas mãos de uma criança.

Sou uma flor

Dançando,

Sou estória,

História morta à nascença.

Semeio palavras na eira madrugada,

Quando das nuvens acordam os pássaros vagabundos,

Milimetricamente falando,

Sou uma página cansada,

Cansada das palavras sem rumo,

Sou uma velha enxada,

Enxada que transforma o mundo.

Tenho na mão

A equação do adeus ingrime da solidão,

Tenho na mão, a mão da minha mão,

À mão do meu coração.

Sou, então, uma velha página a arder,

No corpo da serpente,

Sou uma página de escrever,

Escrever o que ela sente.

Tenho na mão,

Milimetricamente falando,

Todo o cansaço de viver.

Tenho na mão,

Na minha mão,

Palavras para escrever,

Escrever para não sofrer.

Sofrendo, ela percebe que pertenço aos números primos.

Sou estátua que dança na neblina,

Sou equação que brilha na escuridão;

E todos nós sentimos,

A cidade menina,

À cidade minha canção.

Tenho nesta mão,

Um pedacinho sorriso beijar,

Tenho na outra mão,

O desejo simples de amar.

Escreves-te entre uma recta paralela

E finas lâminas de geada,

Escreves-te quando nasce o sol na nossa triste aldeia;

E sabes, rosa amarela?

Do teu jardim vem até mim uma rosa cansada,

Cansada e tão bela…

Tão bela essa Sereia.

E, entre equações

E palavrões,

Deus não mete a colher.

Não se importa,

Nem quer…

Não quer que eu abra esta triste porta.

Sendo assim,

Todas as equações,

Todos os palavrões

E todos os trambolhões,

São cremados

E sepultados,

No meu alegre jardim.

(o jardim das ilusões)

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 5/11/2021


16.04.19

O amor é uma merda.


No coração não temos nada,


Nem melodia, nem palavras, nem uma simples canção…


Quando acorda a madrugada.


O coração não ama, não chora,


O coração é uma máquina, uma bomba, nada mais do que isso.


Ninguém está no coração de ninguém,


Nem as palavras, nem as almas penadas…


O amor é uma merda,


Complexa,


Como os rochedos da floresta.


Será o amor uma equação diferencial?


O esforço transverso?


O momento flector?


Ou será o amor apenas uma pequena flor,


Na lapela de um qualquer caderno quadriculado…


Tudo isso, é nada.


A paixão é como a sombra das minhas bananeiras,


Ou como o sumo das minhas tâmaras…


Azedas,


Tristes,


Como a alvorada.


Poderá um petroleiro ser amor?


Uma jangada sem destino,


Em direcção ao abismo?


E o coração?


Uma máquina, apenas, nada mais do que isso.


O amor é uma merda,


Como todas as flores do teu jardim,


Feias,


Raquíticas…


Anormais.


Será o amor uma equação trigonométrica?


Do tipo:


O co-seno ao quadrado do amor mais o seno ao quadrado do amor é igual a um…


Pronto.


 


 


 


Francisco Luís Fontinha – Alijó


16/04/2019


02.04.15

A vertigem


O dia triste


Quando é envenenado pela saudade


Há no olhar da esperança


Um cigarro poético


Derramando palavras


E nuvens cinzentas


A rua perde-se em mim


Como eu me perdi nos teus braços


De aço


Prisioneiro dos cadeados invisíveis


O marfim dos dentes do crocodilo


Esperam-me sobre a mesa da sala de estar


Não estou


A porta encerrada


Sempre


Sempre


Como o mar submerso na neblina de sal


A vertigem


Apodera-se dos meus sonhos


Não há rios nesta cidade indesejada


Os peixes


Não


Não estou


Hoje


Nunca


À tua espera


Porque não espero nada


Nem ninguém


Como nunca esperei a madrugada crescer


Nos teus cabelos


A vida me come


A vida me mata


A fome


E…


Será que tens cabelos?


Fios de xisto


Descendo o Douro


O meu pensamento está longe


O Tejo


Aguarda serenamente a sombra do meu corpo


A ponte iluminada


Dançava


Quando o vento se alicerçava


E eu


Brincando numa parada militar…


Soldado de pedra


Com uma espingarda de nada


A vertigem sonolenta das coisas belas


Quando o dia


Hoje


Não


Nunca


Os peixes


Não


Não estou


A casa desassossegada


Com a minha ausência


Parti


E ninguém


Percebeu que não estou


Os livros na intimidade do desejo


A vertigem


Nas minhas veias


Caminhando apressadamente


Como os homens acabados de regressar


Do infinito


Os cubos e os círculos de gelo


Palmilham as lâmpadas do medo


Na ardósia


As equações do amor


Sem resolução…


 


Francisco Luís Fontinha – Alijó


Quinta-feira, 2 de Abril de 2015


31.03.15

As línguas abraçadas no céu-da-boca


A chuva argamassada contra o silêncio nocturno


Em redor de dois corpos invisíveis


O prazer nas palavras


Saltitam enquanto folheamos um livro sofrido


Em lágrimas


Da morte inanimada


O Sol embrulhado dentro de quatro paredes


O tecto desce


Desce…


E tomba no pavimento lamacento de um dos corpos


O fim da tarde evapora-se


Nos lábios de um cigarro


Negro


Noite


Sombrio


Como os pássaros da minha aldeia


Subo aos teus cabelos


E sento-me nas avenidas envernizadas da madrugada


A cidade cresce


Os automóveis enfurecidos


Em raiva


Como os cães selvagens


Montanha abaixo


A ribeira espera-os


Como visitantes insignificantes


O sexo suspenso nos cortinados do desejo


Os gemidos


E as sílabas da saudade


Há no teu corpo


Vapor de água


E cristais de prata


A imagem das tuas coxas em finas lâminas de desassossego


O mar


O mar dentro de ti


Construindo marés de esferovite


E alguns sorrisos apaixonados pelo sono


Perdi-me neste tempo infinito


Quando ainda existiam equações de areia


No quadriculado olhar


Hoje


Sou uma caneta avariada


Que deixou de escrever palavras


Que…


Que tem uma lápide sobre a secretária


E uma fotografia


Húmidas vogais


Agarradas às escadas da paixão


Sem saberem que a morte


Não é a morte


Que o medo


Não é… o medo


Voar


Sofrer enquanto caminho sobre um arame


(sempre quis ser trapezista)


Artista de circo


Palhaço


Andante…


Sem nome


Quando acordo e sinto que estou vivo


A praia parece a eira de Carvalhais


Graníticas espigas de cio


Nas frestas do sonho


Oiço o sino da Igreja


Quase a desfalecer


Tensão alta


(dizem)


E nos teus cabelos


As luas de Saturno


Envergonhadas


E Titã…


Entre beijos e poeira…


  


Francisco Luís Fontinha – Alijó


Terça-feira, 31 de Março de 2015

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