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Cachimbo de Água

Blog de Francisco Luís Fontinha; poeta, escritor, pintor...

Blog de Francisco Luís Fontinha; poeta, escritor, pintor...


19.05.15

Os teus braços aqui ao lado,


Parecem serpentes esfomeadas


Esperando as palavras da noite,


Ambos sabemos que as palavras não regressarão nunca,


Como nós,


Impossível regressarmos de onde partimos,


Complicada


Esta vida de marinheiro sem embarcação,


Complicada


Esta vida de transeunte sem cidade,


Ou livro, ou cais…


Para aportarmos,


 


Falta-nos tudo


E tudo temos,


 


As crateras e os peixes,


O silêncio e a madrugada,


Embriagados destinos


Com sabor a nada,


 


E os teus braços


Mesmo aqui ao lado,


Serenos,


Deitados…


Ouvindo os apitos dos comboios encurvados no Douro,


O rio


Sofre,


O rio


Sente


Os teus braços…


Nos meus braços


Afogados.


 


Francisco Luís Fontinha – Alijó


Terça-feira, 19 de Maio de 2015


30.04.14

havia em ti pérolas de naftalina


eu pensava que o mar era só meu


e o egoísmo alimentava-me e fazia com que as minhas asas de amanhecer...


ardessem


como o cigarro que fumo e suspenso na janela com vista para os patamares do Douro


o rio entranhava-se em pedacinhos de dor


sofrimento


e algumas lágrimas invisíveis... poucas... voavam como gaivotas sem nome


descubro o amor numa solitária videira


a paixão numa triste pedra em granito... perdida na rua


à espera do silêncio na esquina sem transeuntes


e oiço as palmeiras com sombras de doirado anoitecer.


 


 


Francisco Luís Fontinha – Alijó


Quarta-feira, 30 de Abril de 2014


23.09.13



foto de: A&M ART and Photos


 


há tanto silêncio nos lábios de um rio


há dor insignificante nos braços de um drogado


há pétalas cansadas nos guindastes dos teus olhos


pérfidas madrugadas


poemas e velhas canções


há janelas de onde nada consegue sobreviver como as ratazanas de esgoto


escadas sem corrimão de acesso ao sótão da insónia


há poetas e aprendizes de poetas


e eu


eu nem uma porta de entrada consigo ser


nem uma simples fechadura consigo abrir


e este coração é louco entre palavras e sensações


 


memórias


histórias


canções perdidas nos teus seios de capim...


há tanto silêncio nos lábios de um rio


que sinto medo de morrer


partir


morrer e não saber como são os socalcos depois de a chuva cair


partir


sem o saber


livremente voando sobre ti em desenhos quadrados de um colorido beijo


há tanto silêncio


sobre o caixão invisível que embrulha a minha paixão de esferovite...


 


(não revisto)


@Francisco Luís Fontinha – Alijó


Segunda-feira, 23 de Setembro de 2013



18.09.13



foto de: A&M ART and Photos


 


Poderia perceber a tua ausência, e mesmo assim, acredito nas planícies do teu olhar mergulhado em espuma e corações amarrotados, que vivem, que fingem viver dentro de algibeiras com janelas de porcelana, opacas, tristes muralhas para que me seja proibido


Olhares-me,


Habito num castelo sem escadas, muros, flechas com ponta de aço, e nem gaivotas me visitam, amo e sei que sou amada, choro e percebo que sou chorada, desejo e sei que sou desejada, e das tristes muralhas para que me seja proibido sonhar, oiço as tuas palavras contra os cortinados de vento, rodopiando em redor do meu corpo, suspenso, levitando como uma espada de aço no peito de um soldado,


Olhar-te e perceber que já não és tu, olhar-te e perceber que deixaste de pertencer aos uivos gritos das sandália plastificadas, sonolentas, olhar-te e perceber que eu não sou eu


Deixas-te de existir, vives não sabendo viver, comes, bebes, e esperas o regresso do mar que nunca ninguém nos garantiu que existia, que ninguém dos nossos presente garante ter visto, e no entanto, esperamos, temos esperança que desçam das sílabas mórbidas das flores comestíveis...


Olhares-me


Apareçam os tão desejados muros com alicerces de prata, o xisto revestido e desenhado como se de um vestido se tratasse, e os pássaros, esses imbecis... comem às mãos das costureiras que travestem agulhas e dedais antes de cair a noite


Sobre mim?


Olhar-te... cansa-me!


Beijares-me?


“Estou triste, meu amor, dizem que não vou ganhar a bicicleta...!”, e precisava tanto dela, e precisava tanto


De mim?


Não, não... chegava-me apenas a tua sombras disforme, envenenada pelos espelhos das montanhas adormecidas, na tela misturam-se cores abstractas, imagens fotográficas voam sobre um velho rio com cabelo branco, um planeta poderia chamar-se de “Uva Moscatel” e o meu próximo negócio vai ser precisamente vender lotes de terreno na Lua, assim


De mim?


Ou então


Melhor ainda,


Melhor de que lotes de terreno na Lua? Não, Não consigo deslumbrar...


Podias vender garrafas com o ar de Trás-os-montes,


Melhor ainda,


Podias vender garrafas com o ar do Douro Vinhateiro,


“Estou triste, meu amor, dizem que não vou ganhar a bicicleta...!”, e precisava tanto dela, e precisava tanto


De mim?


De ti e das tintas acrílicas para preencher as imagens a preto-e-branco das fotografias que suicidam árvores antes de cair a noite e de se evaporar a tarde, na Feira da Ladra?


Saem três garrafas de ar de “Trás-os-Montes”,


Com certeza, minha adorada senhora, é para já... deseja factura?


Não?


Olhar-te e perceber que já não és tu, olhar-te e perceber que deixaste de pertencer aos uivos gritos das sandália plastificadas, sonolentas, olhar-te e perceber que eu não sou eu, olhares-me e entenderes que sou, fui, e serei


Esquelético?


Não, não minha querida,


Às vezes sinto-me uma mesa de uma sala de jantar, à minha volta, imensos parvalhões sentados em cadeiras forradas a pele de crocodilo, apetecia-me prender-lhes as pernas com uma corda e atirá-los pela janela, ouvia-os caírem sobre os rochedos da madrugada, partia-se uma das garrafas com ar do “Douro Vinhateiro” e


Quanto custa?


São vinte e cinco euros, vinte e cinco deslumbrantes euros, e se o desejarem


Autografadas?


Claro, não problema...


“Estou triste, meu amor, dizem que não vou ganhar a bicicleta...!”, e precisava tanto dela, e precisava tanto


De mim?


De ti?


Claro, não problema...


 


 


(Ficção – Não revisto)


@Francisco Luís Fontinha – Alijó


Quarta-feira, 18 de Setembro de 2013



28.07.13



foto de: A&M ART and Photos


 


Esquilos, nozes em vozes, mamilos denegridos, absortos, lábios lânguidos, corpos absolutamente sós, como eles, e como nós, os vizinhos quando lhe batiam à porta em maciça madeira, ele, ainda embriagado pela poesia não escrita, escondia-se, fazia-se... morria, não percebendo depois, que tudo era a fingir, acordava, voltava a dormir, deixou de sorrir, deixou de viver, não queria passear-se pelas cansadas margens de um doente rio, vivia-se, e ia-se vivendo, não sabendo, nunca, o horário penumbro das amendoeiras em flor,


Descia-se,


Subia-se,


E chorava-se,


Esquilos vaidosos roendo nozes de brincar, fantasia, histórias ao almoçar, sobre uma pequena mesa, de pedra, no quintal, uma árvore e um pássaro, preto, bico amarelo,


Melro?


Melro, talvez, porque não?


Inchados, os pilares de areia que seguram as amarras das tristes varandas com murchas flores, ao longe, a praia, o silêncio, o corredio de machimbombos vomitando sonhos adormecidos entre o Baleizão e o Mussulo, batiam-me à maciça madeira porta, eu, eu escondia-me, ou simplesmente berrava


Não estou em casa, hoje,


E eles, elas, acreditavam..., tão parvos, e continuava fingindo dormir, quando na verdade, eu, eu estava morto, desde criança, morri, recordo-me vagamente, tinha alguns poucos, não muitos, seis anos de vida, lembro-me como se fosse hoje, era Setembro, brevemente começavam as vindimas


O que são vindimas, pai?


É o apanhar das uvas...


Uvas, o que vão uvas, pai?


Não percebia que as videiras


Pai, sim filho, o que são videiras?


Não percebia que as videiras davam uvas, que existiam cachos, e lembro-me como se fosse hoje, era Setembro, quase, quase começavam as vindimas, e lembro-me, morri, depois, embrulharam-me num lençol de água salgada, permaneci assim cerca de vinte e oito dias, era Outubro, caiam as folhas das árvores, e eu, eu perguntava-me porque caiam as folhas das árvores,


O que são vindimas, pai?


É o apanhar das uvas...


Uvas, o que vão uvas, pai?


Não percebia que as videiras


Pai, sim filho, o que são videiras?


E pela primeira e última vez, eu, eu tive vergonha de perguntar ao meu pai


Pai, porque caem as folhas das árvores?


Eu tive vergonha de perguntar ao meu pai se esta terra era para sempre ou apenas para eu brincar, e começaram as chuvas, e o frio, a geada e a neve, e eu, eu morto, fui ficando, fui ficando... embrulhado num lençol de água salgada.


 


(não revisto)


@Francisco Luís Fontinha – Alijó


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