Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Cachimbo de Água

Blog de Francisco Luís Fontinha; poeta, escritor, pintor...

Blog de Francisco Luís Fontinha; poeta, escritor, pintor...


04.11.23

Ao longe o som da lareira

Abraçada aos barcos da minha infância mimada

Flautas de néon melodiam o teu olhar

Ao longe o sorriso da ribeira

Que não se cansa da madrugada

E corre sempre para o mar

 

Ao longe o teu cabelo em silêncio vento

Insónia noite ao despertar

Como as flores da Primavera adormecida

Ao longe o faminto alimento

Que o homem procura num pincelado olhar

Ao longe a luz prometida

 

Aos barcos da minha infância mimada

Ao longe as cubatas envenenadas pelo capim

Que a tarde construía em volta do musseque zincado

Ao longe o teu peito em tardes animadas…

Trazendo os cheiros do jardim

Quando o vento é apenas um sonho sonhado

 

 

 

04/11/2023


27.03.23

Bebo o cálice de cicuta

Peço ao diabo que coloque mais lenha na fogueira

Escrevo a última carta

Puxo de um cigarro

Desenho nos lábios da paixão

A forca

Depois

Recebo a visita do criador

Quer que eu me transforme em árvore

Digo-lhe que não me apetece

Digo-lhe que vá para o caralho…

 

Sento-me à porta do cemitério

E conto os barcos que passam

Desenho na mão os barcos que passam

E os barcos que choram

E de todos eles…

Sinto a falta do meu pequeno barco a motor

Que colocava numa pequena poça… junto ao mar

E passava as tardes em círculos

Toda a tarde

Em círculos

 

Termino o cigarro

Ainda respiro

Graças a Deus

Levanto-me da cadeira onde me sentava

Em frente ao cemitério…

E começo a escrever no sorriso da noite

Enquanto a noite ainda me sorri

Enquanto a noite…

É noite

 

Depois…

Depois sei que a noite se vai travestir de puta

Que a noite vai correr pelas ruas de Lisboa

Que a noite se vende por um cigarro…

E que o magala de ontem

É o magala de hoje

Que o magala de ontem

Fode o magala de hoje

E que todos os barcos de ontem

São a sucata de hoje

Que os miúdos de ontem

Hoje

Alguns

São assassinos

Bêbados e drogados

Putas e travestis…

 

Bebo o cálice de cicuta

Peço ao diabo que coloque mais lenha na fogueira

Escrevo a última carta

Puxo de um cigarro

E finalmente oiço a voz do silêncio

Pego na espada que transporto junto ao peito

Olho-a

Ela olha-me

E dou-me conta…

Que o triciclo com que eu brincava

Hoje é um monstro

De madeira

Tem olhos azuis

E come todos os magalas que brincaram junto ao Tejo.

 

 

 

Alijó, 27/03/2023

Francisco


19.08.18

O que eu estranho na tua voz,


Os musseques de Luanda, ao longe, a praia e o mar…


Sinto o velho capim embrulhado nos meus braços,


Assobios,


Abraços,


Sinto no meu corpo o sorriso dos mabecos, enfurecidos pela tempestade,


Chove, a água alicerça-se no meu peito,


Estou morto, nesta terra sem fim,


Dilacerada como um cancro de chumbo poisado no meu sorriso…


A morte é bela,


E passeia-se pela minhas mãos.


 


Ouves-me? Camarada das noites perdidas…


 


O que eu estranho na tua voz,


O silêncio das flores,


As raízes do cansaço em frente ao espelho, sinto e vejo… o susto,


O medo de adormecer no teu colo,


Meu cadáver de lata,


Recheado de lâmpadas encarnadas…


 


Ouves-me? Camarada das noites perdidas…


 


A jangada laminada,


O sorriso de uma pomba, correndo a Calçada,


E no final da tarde,


Antes da alvorada,


Uma pedra se parte, arde na minha mão, como uma faca de sombra…


Cravada no corpo.


 


Assobios,


Abraços,


 


Enquanto eu o que estranho na tua voz,


São as sílabas do desespero.


 


 


Francisco Luís Fontinha


Alijó, 19/08/2018


11.06.17

O delírio fantasma que a paixão oferece nas noites de melancolia,


Vivo nesta cabana encerrada e sem alegria,


Entre livros e papelada,


Entre copos e corpos sofridos na madrugada,


Tenho nas veias o teu nome,


E na algibeira as réstias da fome…


Do mendigo ancorado às esplanadas de lata,


O Domingo termina na sanzala…


No capim brincam as minhas mãos de fada…


Que um papagaio de papel inventou na alvorada,


Sinto neste meu corpo desajustado da realidade


O vício sintético da falsidade…


O orvalho clandestino,


O sorriso do menino…


Na praia do Mussulo,


Só e abandonado,


Só e amedrontado,


Só nos rochedos pincelados de palavras mortas


Pela caneta do poeta,


Fracassado,


Pateta…


O delírio fantasma


Dos arraiais da felicidade,


Foguetes, e pó de enxofre na claridade nocturna do sentimento,


Sofro, sofro e guardo no sorriso a tua despedida…


Sangrando as avenidas


Desta cidade perdida,


Um diário disperso, um livro desassossegado,


O vazio buraco negro do desgraçado…


Mendigo da multidão,


Haja alegria e pão na eira,


Que no corpo da feiticeira


Argamassam os lábios da solidão,


Não durmo, meu amor, deixei de dormir, meu amor…


E passo a horas a desenhar,


No teu corpo, meu amor,


O delírio fantasma da paixão.


 


 


 


Francisco Luís Fontinha


Alijó, 11 de Junho de 2017


12.10.15

desenho_12_10_2015.png


Fontinha – Outubro/2015


 


Ouvi-los… nunca,


Estes loucos pássaros envergonhados e tristes,


Estes homens sem fronteira


Galgando a sombra de outros homens,


Na fome, na miséria beleza


Quando o mar se aproxima, e mata, e eles fingem morrer,


Junto à ribeira,


Com o medo de tudo perder,


Eles, os pássaros, eles, os homens sem fronteira,


Agachados nos riachos envenenados pelo dinheiro,


Rastejando no capim outrora fértil de palavras…


E hoje, e hoje Oceanos de lágrimas laminadas.


 


Francisco Luís Fontinha – Alijó


Segunda-feira, 12 de Outubro de 2015


 

Mais sobre mim

foto do autor

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2023
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2022
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2021
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2020
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2019
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2018
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2017
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2016
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2015
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2014
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2013
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2012
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2011
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
Em destaque no SAPO Blogs
pub