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Cachimbo de Água

Blog de Francisco Luís Fontinha; poeta, escritor, pintor...

Blog de Francisco Luís Fontinha; poeta, escritor, pintor...


11.10.22

Acordas na tela das noites sem estrelas, percebo que é noite quando o meu cigarro se extingue no negro sonho e o meu rosto é afagado pela fotografia do mar que habita sobre a secretária, ela, só e vazia, e percebo que é o mar pelo cheiro e barulho dos peixes de brincar enquanto dançam junto aos barcos em cartolina cansada, sem cores, sem olhinhos.

Do branco algodão, emergem da clarabóia suspensa no tecto, as estrelas que fugiram da noite e teimam infernizar-me com os conselhos parvos de sempre, e sou forçado a disparar a espingarda da solidão para as afugentar; como eu te compreendo, meu querido, como eu te compreendo…

E antes de acordar, esta triste manhã que todos os dias, a todas as horas, semana após semana, mês após mês, abraça-me como se eu fosse um pedacinho de geada em hipotermia, depois de descer do telhado da insónia e em pequenos gritos, e em pequenos uivos, vai esconder-se junto à fotografia do mar. É certo que um dia, este mar vai partir, como partiram todas as minhas fotografias.

Como partiram todos os meus mares.

Acordas na tela, indiferente aos meus desejos, porque nas minhas palavras inventadas, quando as invento, desenho desejos, e tu, abraças-me com um olhar silenciado que vindo de uma manhã, quando acorda, parece a tempestade em pequenos voos sobre os plátanos da saudade. E a tela, continuará branca. E de branca,

Deitas-te em mim,

Milagre das noites ensonadas, princesa da saudade.

Depois, ergues-te da tela branca e desapareces como desapareceram as estrelas da noite, como desapareceram todas as palavras que guardava naquela caixa em cartão, e hoje, são apenas palavras. E hoje são apenas lixo.

E de olhinhos tristes, esta manhã que todos os dias acorda na minha branca tela, foge, e transforma-se em mulher; a menina dos olhinhos tristes.

Invento então, nas pequenas ardósias da saudade, os traços que lanço contra as paredes de vidro onde habitam pequenas figuras de rosto fingido, que depois do sono, são apenas figuras; algumas, pertencem aos rios que deixaram de correr para o mar, e nos olhos, levam as lágrimas dos tristes socalcos, onde uma enxada, às vezes em revolta, escreve no difícil xisto o mais lindo poema de amor.

Ergue-se, sem perceber que a minha branca tela, é apenas uma simples branca tela, sem perceber que depois de misturar todas as cores possíveis e imaginárias, uma cabeça negra, como são todas as noites, como são todas as cabeças, deita-se na minha mão.

E um dia, a manhã de olhinhos tristes, será a mais bela branca tela que a Primavera deu à luz. Como todas as mais belas andorinhas que a Primavera lança contra as manhãs de olhinhos tristes.

 

 

Alijó, 11/10/2022

Francisco Luís Fontinha


21.04.22

Onde poisam as andorinhas

Do meu país!

Onde brincam os poetas

Do meu País!

Onde habitam

As pedras do meu País!

 

Onde estão os sonhos do meu País!

 

E bebo deste rio

A saudade do meu País,

E alicerço no meu olhar

A revolta do meu País,

 

E sonho com as madrugadas

Do meu País…

 

Todos os dias!

A todas as horas!

 

Onde poisam as andorinhas

Do meu país,

Que no papel amarrotado

Escrevo ao meu País,

E enquanto pinto este rio,

Uma enxada,

Despede-se do meu País;

Com fome. Com sede.

 

E sonho com as madrugadas

Do meu País…

E sonho com os rios

Do meu País.

 

E esta andorinha que não voa,

Porque no meu País

Roubaram as madrugadas,

Porque no meu País,

Roubaram as palavras,

Porque no meu país já somos poucos… ou quase nada.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 21/04/2022


10.03.15

Em farrapos


as palavras desenhadas no teu corpo


entranham-se na tua pele


os cubos e os círculos do desejo


tens no olhar o espelho da saudade


saudade de...


em farrapos


as palavras


e a cidade


que morrem na clandestinidade


as ruas dormem docemente nas tuas pálpebras cinzentas


como pássaros embriagados pela madrugada


 


não oiço o sino da Igreja


porque o teu sorriso


deixa-me surdo


cego...


sem... sem palavras... cansado


em farrapos


de ninguém


ao acordar


o pequeno-almoço dispensa-me


fui despedido pela boca do sono


e alimento-me de cigarros


e palavras... em farrapos... a arder...


 


as migalhas inventadas por um livro de poesia


o livro de poesia poisa sobre a secretária


e o teu corpo nos meus braços


baloiça


dança


e sinto


a Primavera e a esperança


e a esperança


esperança...


esperança...


nos lábios das andorinhas


em flor... em cio... antes de partir o dia.


 


 


Francisco Luís Fontinha – Alijó


Terça-feira, 10 de Março de 2015


31.01.15

Pintura_55_A1_Nova.jpg


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


 


 


Roubaste-me o sorriso nocturno dos beijos em flor


pegaste nas minhas palavras e transformaste-as em solitárias andorinhas


depois


trouxeste a Primavera


e o amor


do poema


de amar o poema


e sentir no peito as equações do destino...


 


 


Francisco Luís Fontinha – Alijó


Sábado, 31 de Janeiro de 2015


 


25.12.14

Os orgasmos poéticos


quando do chão esfomeado


se levanta


a matriz


ouvem-se as vozes disformes das andorinhas em flor...


ouvem-se... as sombras de aço nos lábios de uma abelha!


 


 


Francisco Luís Fontinha – Alijó


Quinta-feira, 25 de Dezembro de 2014

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