19.01.22
Aos beijos versados
Argamasso as palavras envenenadas no silêncio,
Escuto, sinto a tua voz melódica de incenso
Quando voa na ressurreição do desenho,
E nas catacumbas da solidão,
Vejo os teus lábios incinerados na madrugada,
Como se todos os pássaros fossem filhos de Deus.
Há na palavra
Uma oração cansada,
Distante de mim,
Distante da alvorada.
Aos beijos versados
Lanço as flores do meu jardim,
São flores em liberdade,
São pedaços de mim.
E o poema ergue-se como se erguem as vozes
Que chamam por Deus,
Ou que se revoltam contra Deus,
Como se Deus fosse o culpado,
Do poema estar envenenado,
Ou…
Os teus beijos
Sejam versados,
No espelho da paixão.
Aqui me sento sem prazer,
Lendo, escrevendo,
Ou em nada fazer.
Mas dizem que Deus está a ver,
Que nos olha como olhava por mim
A minha mãe, em viagem sem regresso…
Ao pó os teus pedaços ósseos
Na garganta do tumor,
E que esta viagem sem regresso
Seja apenas uma fotografia,
Recordação;
Nos beijos versados, o poema está vivo, vivo e em dor.
Francisco Luís Fontinha
Alijó, 19/01/2022