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Cachimbo de Água

Blog de Francisco Luís Fontinha; poeta, escritor, pintor...

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09.10.11

O parvo acreditava em tudo o que lhe diziam,


Que o mar só tem ondas porque existe o vento, que se uma borboleta bater as asas na Indonésia um tufão nos Estados Unidos da América acorda e começa a cuspir silêncios de água suspensa nas manhã de solidão,


E que deus está sentado à direita do pai,


O parvo acreditava em tudo o que lhe diziam,


Que as nuvens são pedacinhos de algodão e as mulheres têm nos lábios sorrisos de mel,


- É tudo uma aldrabice pegada Confessava ele na esplanada do café onde quatro amigos invisíveis o acompanhavam,


O parvo acreditava em tudo o que lhe diziam e que o amor quando verdadeiro é como as estrelas do céu, cintilam e prendem-se às janelas das árvores deitadas na praia,


- É tudo uma aldrabice pegada os quatro amigos invisíveis e a lua e Luanda e o mar,


Nunca existiram,


O parvo acreditava em tudo o que lhe diziam,


E que os beijos são o pôr-do-sol antes de cair a noite sobre o rio que corre apressadamente para o mar,


- E que nunca existiu,


Belém,


- E que nunca existiu,


Calçada da Ajuda,


- E que nunca existiram,


Putas a pedincharem cigarrinhos junto à estação de Cais de Sodré,


- E que nunca existiu,


Um menino debaixo das mangueiras a espetar pregos na sombra da tarde e sobre o triciclo o chapelhudo em queda livre até aterrar junto à capoeira, e as galinhas fingiam que acreditavam em tudo, dava-lhes grãozinhos de areia trazidos propositadamente da ilha do Mussulo e elas que acreditavam em tudo agradeciam-me,


- O milho saboroso da madrugada,


Um menino que corria entre o néon dos musseques e as lágrimas do céu, um menino que acreditava em tudo,


- O milho saboroso da madrugada,


Que tombava como pétalas de dor das mãos do menino que acreditava que os barcos tinham mãos, e que os aviões quando lá no alto encolhiam e adormeciam junto a deus sentado à direita do pai,


- E que nunca existiu,


E que nunca existiram mangueiras no meu quintal,


- E que nunca existiu,


Calçada da Ajuda,


- E que nunca existiram,


Cacilheiros enrolados ao cacimbo,


Porque o parvo que acreditava em tudo o que lhe diziam,


Um dia,


Deixou de acreditar,


E as galinhas deixaram de comer os grãozinhos de areia trazidos propositadamente da ilha do Mussulo,


- O milho saboroso da madrugada,


Nas ruas de Luanda.


 


(texto de ficção)

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